Mensagem do Primeiro-Ministro, Kay Rala Xanana Gusmão, para o Dia Nacional dos Veteranos, 3 de março de 2024

Primeiro-Ministro

IX Governo Constitucional

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Díli, 2 de março de 2024

Comunicado de Imprensa

Mensagem do Primeiro-Ministro, Kay Rala Xanana Gusmão, no Dia Nacional dos Veteranos, 3 de março de 2024

Dirijo-me a todos os Companheiros de Luta, perante os quais me curvo, aos Veteranos e Combatentes da Libertação Nacional, a quem respeito imenso, a todos os idosos e idosas, a quem chamo Heróis Vivos, e a todos os nossos jovens, em todo Timor-Leste.

Gostaria de felicitar a Comissão Organizadora, composta por Veteranos, por terem conseguido organizar este evento, para celebrarmos este importante dia na História de Timor-Leste – o Dia 3 de Março.

Bem sei que, se em 2021 não tivéssemos tido a pandemia de COVID-19, teríamos celebrado o quadragésimo aniversário do dia 3 de março, um momento em que, quando estávamos no mato, levámos a cabo uma importante atividade que nos permitiu continuar a luta contra o inimigo. E celebramos nesta data porque essa atividade a que me refiro ocorreu precisamente no dia 3 de março de 1981.

Contudo esse aniversário já passou, e por isso neste ano estamos a celebrar os 43 anos desde que, em Laline, os guerrilheiros se juntaram para decidir a reorganização da resistência contra os ocupantes.

Caros amigos,

Se me permitem, gostaria de falar um pouco sobre este assunto, especialmente para que os jovens possam compreender melhor a importância do Dia 3 de Março.

I parte - em setembro de 1975, os soldados indonésios começaram a invadiram o território de Timor-Leste, iniciando a sua entrada na fronteira e ocupando as áreas de Maliana, Balibó e Batugadé, e aproximando-se da ribeira de Loes.

Depois, em 7 de dezembro de 1975, a Indonésia decidiu, com o apoio dos seus aliados, invadir a cidade de Díli, utilizando tropas paraquedistas, procurando de seguida avançar para outras vilas. 

II parte - a população de todas as regiões de Timor-Leste procurou refúgio nas montanhas, e, depois de uma reunião realizada em Soibada, em maio de 1976, foi decidido que a população deveria organizar-se em Bases de Apoio. Isso levou à criação dos setores militares: Fronteira Sul, Fronteira Norte, Centro Norte, Centro Sul, Centro Leste e Ponta Leste, para que dessa forma as Companhias das FALINTIL pudessem tentar proteger a população quando esta fosse atacada pelo inimigo.

A partir de julho de 1977, o inimigo levou a cabo operações massivas, conhecidas como 'Campanhas de Cerco e Aniquilamento', atacando setor por setor. Inicialmente, começaram no Setor Fronteira Sul, avançando para o Setor Fronteira Norte. Tendo derrotado este setor, avançaram para o Centro Norte, Centro Sul e Centro Leste. Por fim, já em 1979, as operações estenderam-se até ao Setor Ponta Leste, culminando na queda das bases do Matebian, em novembro desse ano. Em todos os setores, a Direção da Luta (membros do Comité Central da Fretilin - CCF e os comandantes) ou morreu ou rendeu-se. Da mesma forma, as forças e a população em geral também foram forçadas a render-se.

Assim, podia dizer-se que tínhamos perdido a Guerra.

III parte - Em 1980, a partir da região de Ponta Leste, foram enviados guerrilheiros aos outros setores para tentar saber quem tinha sobrevivido, que forças restavam e quais eram as condições da população.

Esta ação levou aos seguintes resultados: do Comité Central da Fretilin, apenas dois membros tinham sobrevivido, na Ponta Leste. Relativamente às FALINTIL, das mais de trinta mil armas, em 1977, restavam apenas cerca de quinhentas, muitas em más condições e não havia munições.

Depois de analisarmos com detalhe a situação da guerra, ao longo de todo o ano de 1980, para procurarmos perceber por que razão estávamos a perder a guerra, quais as causas do ponto de vista político e militar que estavam a contribuir para esta grande derrota, e o que é que a população desejava, em março de 1981, em Laline, realizou-se a Conferência para a Reorganização da Resistência, com medidas objetivas e que pudessem responder a esta difícil situação.

A 3 de março de 1981, foram emitidas Resoluções muito importantes, para pensarmos de forma alargada sobre a nossa capacidade de continuar a guerra, de que forma nos podíamos organizar para estarmos mais bem preparados para combater o inimigo e como mobilizar todos os timorenses para participarem na guerra, ou na Resistência contra os Invasores.

 

IV – As medidas importantes que saíram dessa Conferência foram as seguintes:

a)    Criar uma Unidade Nacional, para não obrigar os timorenses a aderir à Fretilin, isto porque nas Bases de Apoio os melhores Comandantes e os Quadros mais bem preparados tinham sido mortos por não colaborarem com eles;

b)   Quem quisesse a independência para Timor Lorosa’e, podia participar em qualquer situação, conforme a sua capacidade;

c)    Organizar a Resistência em Três Frentes: -1) Frente Armada, no mato, com as FALINTIL; 2) Frente Política, uma Organização Clandestina, que começou a desenvolver-se através das Organizações da Juventude; 3) Frente Diplomática, através da qual os amigos que estavam no estrangeiro, continuaram a levantar o problema de Timor-Leste em Organizações Internacionais, como a ONU e outras, e que acabou por ser entregue ao Companheiro de Luta, Ramos-Horta;

d)   Em 1983, durante o período de “cessar-fogo”, e após um encontro com o Coronel Purwanto, foi entregue um documento dirigido ao Presidente Soeharto, contendo ideias estratégicas para a resolução da guerra. Tínhamos proposto uma Solução Negociada, que exigia a participação da ONU, de Portugal e da Indonésia, bem como de toda a Comunidade Internacional. A solução proposta era um REFERENDO, perguntando ao povo timorense se queria a integração ou a independência;

e)    Tudo isto com a ideia de que não tínhamos capacidade para combater o inimigo do nosso País, porque não tínhamos armas e nem munições; por outro lado, o inimigo também não poderia ganhar esta guerra, porque todo o povo já tinha demonstrado que poderia sofrer todo o tipo de sacrifícios, mas não ia abandonar o Sonho dos antepassados relativamente à independência;

f)     Tivemos de esperar DEZASSEIS ANOS… - este período tão longo serviu para mostrar que o Povo Maubere é muito corajoso, não desiste em nenhuma circunstância, apesar das muitas dificuldades, de receber ameaças, castigos e morte, e o mais importante, o Povo Maubere é muito consistente com o seu Sonho de Independência, sonho esse que, sabemos, vinha já desde os antepassados.

Esta é uma Breve História, para que possamos celebrar o Dia 3 de Março com a confiança de que, quando queremos alcançar algo de bom, temos de ser consistentes nos nossos princípios, nas nossas obrigações em relação ao nosso amado País e aos nossos Heróis Nacionais.

Muito Obrigado e Grande Abraço a todos.

 

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