Teve início esta quinta-feira, 15 de maio de 2025, a Segunda Conferência Internacional de Díli sobre o Direito do Mar, subordinada ao tema “Enfrentar Desafios: Direito do Mar e Resolução de Litígios Marítimos”. A conferência, organizada pelo Gabinete das Fronteiras Marítimas e Terrestres (GFTM) de Timor-Leste, reúne, durante dois dias, altos responsáveis e representantes de Estados do Pacífico, da ASEAN, do grupo de países frágeis do g7+, da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e de outras nações, com o objetivo de promover o diálogo, a partilha de conhecimentos e a cooperação na resolução pacífica de disputas marítimas.
Na sessão de abertura, realizada no Salão Nobre do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, o Presidente da República Democrática de Timor-Leste, José Ramos-Horta, destacou que “o direito internacional é a base sobre a qual construímos a nossa independência” e recordou que “a Convenção [das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS)] fornece o marco jurídico para a governação marítima, delineando os direitos e responsabilidades das nações em relação ao uso dos oceanos do mundo, à proteção do ambiente marinho, ao direito de todos os Estados de perseguirem usos pacíficos dos mares e para a resolução de disputas de limites marítimos”. Referindo-se à importância do multilateralismo e da cooperação internacional, sublinhou ainda que “as Nações Unidas e o direito internacional são vitais para os pequenos Estados”, na medida em que operam “com o princípio de que todos os Estados, independentemente do tamanho ou poder, são iguais”.
A sessão de abertura contou também com a intervenção do Presidente do Tribunal Internacional do Direito do Mar (ITLOS, na sigla em inglês), Juiz Tomas Heidar. A conferência prosseguiu depois no JL World Hotel com apresentações de peritos e profissionais de renome na área do Direito do Mar, provenientes de governos, universidades, tribunais internacionais e sociedades de advogados.
Durante a manhã, os participantes debateram, no primeiro painel, os desenvolvimentos mais recentes na resolução de diferendos sobre fronteiras marítimas. O segundo painel abordou a resolução de disputas marítimas na região do Indo-Pacífico.
O terceiro painel, dedicado ao tema “Lições Aprendidas com a Conciliação do Mar de Timor”, foi marcado pela intervenção do Ministro da Presidência do Conselho de Ministros, Agio Pereira, que representou Timor-Leste no processo de Conciliação Obrigatória com a Austrália. O governante apresentou uma análise aprofundada do processo que conduziu à assinatura do Tratado das Fronteiras Marítimas, celebrado março de 2018, na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque.
O Ministro Agio Pereira descreveu “a luta de Timor-Leste com a Austrália para assegurar as fronteiras marítimas” como “uma batalha de David contra Golias entre uma nação pequena e uma grande, num contexto de interesses concorrentes sobre recursos e de uma história política complexa”, acrescentando que “foi apenas através da iniciativa ousada de lançar o primeiro processo de conciliação obrigatória ao abrigo da UNCLOS que conseguimos, finalmente, alcançar a delimitação das nossas fronteiras”.
O Ministro afirmou ainda que “a conciliação obrigatória foi concebida precisamente para situações como a que Timor-Leste enfrentava”, “com o objetivo de facilitar a resolução do litígio” e “aproximar as partes para uma solução negociada”. Recordou também que “a 11 de abril de 2016, Timor-Leste tornou-se o primeiro Estado a iniciar um processo de conciliação obrigatória” e que “o tratado foi acordado em outubro [de 2017], em Haia, e finalmente assinado a 6 de março [de 2018], em Nova Iorque, na sede das Nações Unidas, na presença do Secretário-Geral da ONU”.
Ao recordar os principais momentos do processo de conciliação, Agio Pereira sublinhou a importância da liderança e da unidade nacional, afirmando que “Timor-Leste demonstrou uma grande clareza e unidade de propósito. Definimos como objetivo a delimitação das nossas fronteiras marítimas permanentes, com base no direito internacional. Não procurámos favores nem vacilámos perante os desafios. Mantivemo-nos firmes nesse objetivo”. Destacou ainda o papel determinante do Chefe Negociador, afirmando que Xanana Gusmão “é um forte lutador”. A sua experiência e sabedoria foram ativos inestimáveis” e “permitiu que a nossa equipa trabalhasse de forma coesa em torno de um objetivo comum”.
Referindo-se à Comissão de Conciliação, realçou que esta “dedicou tempo a informar-se e a compreender a nossa situação” e que as “medidas de criação de confiança” por si propostas “foram determinantes para fomentar essa confiança”.
O Ministro destacou também o papel do Gabinete das Fronteiras Marítimas, que “funcionou como ponto focal central dos esforços do Estado e também da nossa equipa de assessoria jurídica internacional de excelência”. Finalizou, salientando “o privilégio de contar com o apoio alargado de todos os partidos políticos, da sociedade civil timorense, e de apoiantes na Austrália, em Portugal e noutros países. Todos estiveram unidos connosco, permitindo-nos avançar com negociações difíceis”.
A conferência prossegue amanhã, com o discurso de abertura do Primeiro-Ministro, Kay Rala Xanana Gusmão, e com painéis dedicados à gestão de áreas marítimas em disputa e à promoção da governação dos oceanos, aos impactos das alterações climáticas e da subida do nível do mar na delimitação marítima, aos pareceres consultivos do ITLOS e do Tribunal Internacional de Justiça sobre alterações climáticas, e ao novo Tratado sobre o Alto Mar e as suas implicações para a governação global. A sessão de encerramento contará com a intervenção de Elizabeth Exposto, Chefe de Gabinete do Primeiro-Ministro, Diretora Executiva do GFTM e Co-agente de Timor-Leste na Conciliação do Mar de Timor.
A Segunda Conferência Internacional de Díli assinala ainda o 10.º aniversário da criação do Gabinete das Fronteiras Marítimas e Terrestres.