Recursos Naturais de Timor-Leste - O que está a ser feito com o petróleo, com o gás e com os minerais que existem no País

Ter. 30 de março de 2010, 00:04h
Secretário de Estado dos Recursos Naturais, Alfredo Pires 03

Nesta entrevista, o Secretário de Estado Alfredo Pires explica o que está a ser feito e planeado na área dos recursos naturais, em Timor-Leste, especialmente no que toca ao Petróleo. O trabalho da ANP. As instituições que estão a ser criadas. A formação de recursos humanos. Quanto dinheiro dá o petróleo e para onde vai.

O Secretário de Estado dos Recursos Naturais fala ainda da importância da entrada de Timor-Leste para o Comité Internacional do EITI (Iniciativa para a Transparência da Indústria Extractiva) e a cotação que esta instituição dá ao país na gestão do seu petróleo.

Quais são os recursos naturais de Timor-Leste?

A definição de “recursos naturais” em Timor-Leste é muito simples: petróleo, gás e minerais.

Quando falamos de minerais, falamos de minerais metálicos (ouro, manganês, cobre e outros) e não metálicos (areias e pedras). Portanto, temos petróleo, temos gás e temos indicação da existência de vários minerais. Em relação a estes, aos minerais, ainda temos que fazer muito trabalho, mas é um trabalho que ficará para mais tarde. Para já estamos a concentrar-nos num conjunto de prioridades que definimos, tendo em conta a realidade de Timor-Leste e o futuro de Timor-leste. Portanto, para já, o nosso objectivo é explorar o petróleo e o gás, que existe no mar. E isso já está em curso.

O resto (a exploração dos minerais) é outro processo, que também já está em curso, estamos a criar a lei, mas ainda vai levar algum tempo.

Relativamente ao petróleo e gás, que é que está em curso?

O nosso trabalho, no que toca à gestão da exploração do petróleo e do gás, está a ser desenvolvido em várias frentes ao mesmo tempo. Estamos a criar as instituições que são necessárias, a preparar os recursos humanos e a preparar, também, o próprio País para todo este processo.

Começo pelos recursos humanos. Criamos bolsas de estudo e temos, actualmente, cerca de 160 estudantes timorenses, em todo o mundo, a tirar cursos superiores e mestrados. Isto é para os capacitar e, ao mesmo tempo, capacitarmos as nossas instituições com pessoas que tenham os melhores conhecimentos nestas matérias, e no fundo, estamos a pensar no futuro. Também investimos muito na formação dos que estão actualmente a trabalhar e estamos agora a negociar programas de estágio para que adquiram a experiência necessária. Aliás, já temos acordos com empresas que estão a operar em Timor-Leste, empresas petrolíferas internacionais, e ao abrigo desses acordos temos trabalhadores nossos a fazer estágios em vários países.

Quanto à criação de instituições, depois de estudarmos o que foi desenvolvido por outros países, chegámos à conclusão de que é melhor separar as áreas – a entidade reguladora, os poderes operacionais e a investigação não devem estar misturados. Então, para já, criamos a ANP (Autoridade Nacional de Petróleo) para regular o sector e agora, estamos em vias de criar a Companhia Nacional de Petróleo para fazer os negócios, bem como o Instituto de Petrologia (petróleo e geologia) para desenvolver investigação. Estas são as instituições que achamos, para já, necessárias, e consideramos que é melhor que estejam separadas, apesar de, claro, ter de haver alguma ligação. Mas vamos separar as funções.

Quem faz a política é a Secretaria de Estado dos Recursos Naturais. Fazemos a política, fazemos as leis e ao mesmo tempo envolvemos a sociedade civil através de consulta pública. Portanto, tentamos encontrar um sistema que seja equilibrado, eficiente e eficaz para gerir os nossos recursos naturais. Como lhe disse, para já, com atenção especial para o petróleo e gás.

Portanto estão a ser criadas as bases para Timor-Leste poder operar de forma independente.

Estamos as criar as bases para capturar todas as oportunidades que surgirem nesta matéria. E neste processo ganhamos a capacidade para gerir os recursos, mas vamos continuar a precisar de assistência internacional. Temos consciência de que somos um país pequeno. Agora, temos que ter capacidade é para acompanhar todo o processo: as empresas a quem Timor-Leste encomenda estudos, temos que ter capacidade de acompanhar e, até, dirigir, na medida da nossa possibilidade, o que fazem. E posso dizer que estamos no bom caminho, já temos uma certa capacidade.

Capacidade a que nível?

Já temos trabalho desenvolvido, e alguns estudos. E a direcção da Autoridade Nacional do Petróleo, é composta apenas por timorenses e são todos qualificados. Regulam o sector, obrigam as empresas a cumprir os contratos que assinaram com o país. Timor-Leste está a ter uma certa imagem internacional ao nível do petróleo. Posso dizer, por exemplo, que a empresa italiana ENI, que desenvolve trabalho em vários países, já nos disse que trabalhar com os timorenses é muito confortável, no sentido em que cumprimos.

Concretamente, no que toca à extracção de petróleo,  o que é que já foi feito em Timor-Leste?

Temos um campo de petróleo que já está a funcionar, e somos nós que estamos a regular tudo, através da nossa agência reguladora, a ANP. E isso, para nós, claro, constitui uma grande diferença e uma boa conquista.

Ao contrário do que chegou a ser dito, de que não teríamos capacidade, o facto é que já lá vão dois anos que a ANP funciona, e funciona bem. Já mostramos claramente que podemos regular o sector, de forma a cumprir as exigências internacionais e com transparência exemplar. É esta a realidade.

Com base em que é que diz isso?

Timor-Leste aderiu a um sistema de boa governação e transparência que se chama EITI (Extractive Industry Transparency Initiative – Iniciativa para a Transparência da Indústria Extractiva) que também é conhecido como “Iniciativa de Tony Blair”, porque foi o ex-Primeiro-Ministro britânico que a criou. É  gerido por um comité internacional, de acordo com as directivas de Oslo. Envolve países, empresas e sociedade civil, ao nível internacional.

Agora, uma notícia que posso avançar é que Timor-Leste também faz parte do Comité Internacional do EITI. E isto é importante para nós, significa, por um lado que Timor-Leste tem credibilidade e por outro, que passa a ter voz nesta importante instituição, de cariz mundial!

De que forma isso é importante para Timor-Leste?

É bastante importante, especialmente se pensarmos que até hoje, apenas dois países: o Azerbeijão e a Libéria (dos cerca de 30 países que aderiram a esta iniciativa) conseguiram cumprir todos os 18 critérios estabelecidos pelo EITI. Um dos critérios é a publicação de um directório - que tem de estar disponível para todo o mundo, incluindo, claro, o próprio país – a explicar quanto dinheiro está envolvido e qual foi o processo de extracção do petróleo. Isto é para determinar o nível de transparência utilizado pelo país perante a sociedade civil e as empresas. Timor-Leste cumpre.

Alguns países argumentam que o EITI não é para eles, porque são países avançados, onde tudo funciona bem, como os tribunais e outras instituições. Mas eu, como membro do Comité Internacional do EITI, questiono até que ponto é que esses países envolvem a sociedade civil no processo?!

Qual é o resultado de Timor-Leste no EITI?

Já fizemos o relatório do EITI e posso dizer que o relatório mostrou que não se perdeu nem um dólar no sistema de extracção de petróleo. Entretanto, a equipa de especialistas internacionais está a avaliar esse relatório e esperamos que no final de Abril saia o resultado.

Estou confiante de que a nossa posição no processo de transparência sobre a extracção do petróleo pode ser muito boa, acho mesmo que podemos ficar nos primeiros cinco, para não dizer em primeiro lugar. Mas vamos esperar pelo resultado.

Qualquer pessoa pode ter acesso a essa informação?

Está tudo na Internet. Basta procurar em EITI Timor-Leste e encontra o relatório com todos os detalhes: quanto dinheiro, que empresas, que impostos, tudo.

Isto é muito importante para a transparência. Somos cerca de 30 países que estamos a lutar para que seja reconhecido o nosso bom nome, a nossa boa governação, e enquanto os critérios não forem cumpridos, este objectivo não é cumprido, o país não é certificado. Mas estou confiante de que Timor-Leste vai conseguir. Daqui a cerca de um mês, no final de Abril, veremos.

Com quase oito anos de independência e numa altura em que o País começa a gerir os seus recursos naturais, qual é o grande desafio de Timor-Leste, neste momento, nesta matéria?

Para mim, o grande desafio são os recursos humanos. Preparar os recursos humanos da melhor forma para desenvolver o que está planeado. Temos que ter noção do número de pessoas que formamos, como e em que áreas, para não criar excessos ou carências. Não sei o que irão fazer os próximos Governos, mas o IV Governo Constitucional, no que toca à gestão dos recursos naturais, está, neste momento, como comecei por dizer, concentrado em utilizar os recursos naturais para melhorar a vida do povo. Nós, quando olhamos para os recursos naturais, queremos trabalho, queremos melhorar a vida do povo.

Quanto dinheiro dá o petróleo a Timor-Leste?

Bastante, dá muito dinheiro. Neste momento, apenas com um campo de petróleo (e pensamos que no futuro iremos ter várias) Timor-Leste está a conseguir extrair cerca de cem milhões de dólares por mês. Uns três, quatro milhões de dólares por dia. Isto quando o preço do barril ronda os 60, 70 dólares.

É bastante dinheiro para uma população de cerca de um milhão de pessoas.

Com esses valores, pode dizer-se que Timor-Leste é um país rico?

Um país rico, infelizmente, ainda com muita pobreza. É verdade. Mas também é verdade que temos a história que temos, e, acima de tudo, é verdade que estamos agora a começar. E construir um país, que ficou no estado em que ficou Timor-Leste... estas coisas não se fazem de um dia para o outro. Temos que construir sistemas e pô-los a funcionar. Temos que criar recursos humanos. Temos que dar tempo ao povo para ganhar confiança. Temos que dar tempo. Não acontece de um dia para o outro.

O processo de desenvolvimento económico é muito lento mesmo quando tudo é feito de forma correcta, agora imagine se falharmos nalgum ponto: atrasamos todo o processo. Esta é a realidade. Para mim, o dinheiro está a entrar rápido demais, mas não podemos para o processo.

O dinheiro está a entrar para onde?

O dinheiro vai todo para uma única conta bancária. Também isto é apontado como exemplar. Não tempos várias contas bancárias, o que dificultaria o controlo. Vai tudo para uma conta bancária nos Estados Unidos da América, e assim sabemos quanto entra e quanto sai.

Porquê nos EUA?

A moeda americana era mais estável. Investimos em instrumentos financeiros americanos que são bastante seguros e achamos que este é o melhor sistema. Mas agora começamos a ter uma certa capacidade para tentar diversificar este portfolio. Não arriscando muito estamos a tentar obter mais lucros desse nosso fundo, dessas nossas poupanças.

Desse fundo, que dinheiro é utilizado?

Isso está muito bem definido na nossa lei. Podemos apenas utilizar o que a lei permite, e a lei permite que utilizemos apenas três por cento da riqueza do petróleo. Há quem considere que isso é muito pouco, que precisamos de mais agora que estamos a criar as infra-estruturas do país, mas é o que está na lei... e isso é outro debate, uma discussão que está em cima da mesa.

Mas volto a referir, o nosso desafio é preparar os recursos humanos não só na área da gestão dos recursos mas também na gestão financeira. O desafio é grande. Temos que ter as instituições e pôr o sistema a funcionar em pleno.

Recordo que temos apenas oito anos de independência. Os grandes planos que estamos a preparar, ao nível de infra-estruturas, irão colocar o país noutra posição, certamente.Mas acho que estamos com ideias bem definidas sobre o que queremos, sobre o que vamos fazer e como vamos utilizar. E sobretudo, temos consciência das nossas capacidades e, também, das nossas potencialidades.

   Topo